Nota Pública # 8 - Ameaça à democracia e aos direitos humanos
A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns vem a público manifestar seu veemente repúdio e profunda preocupação com as recorrentes ameaças à democracia e aos diretos humanos perpetradas pelo deputado Eduardo Bolsonaro, que recentemente sugeriu a adoção de "um novo AI-5" como resposta a uma eventual radicalização da esquerda.
O Ato Institucional no. 5, editado pelo regime militar em 13 de dezembro de 1968, foi a expressão maior do regime de exceção imposto ao Brasil entre 1964 e 1985.
O AI-5 rompeu com a própria Carta constitucional outorgada em 1967 pelo regime golpista, transferindo plenos poderes ao ditador no exercício da presidência da República, para impor o recesso do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e Câmaras Municiais; para intervir em estados e municípios; para suspender direitos políticos; e para fixar restrições a todos os demais direitos. O AI-5 também autorizou a demissão, a remoção e a aposentadoria de funcionários públicos e o confisco de bens privados.
Com o objetivo de assegurar que a tirania pudesse ser plenamente exercida, o AI-5 suprimiu o habeas corpus e excluiu da apreciação do Poder Judiciário "todos os atos praticados de acordo com este Ato Institucional e seus Atos Complementares, bem como os respectivos efeitos". O AI-5 assegurou, assim, a mais ampla liberdade ao regime autoritário. A partir dele, o Congresso Nacional teve suas atividades suspensas. Parlamentares, com mandato popular, foram cassados. Três ministros do Supremo Tribunal Federal foram aposentados compulsoriamente. Milhares de brasileiros tiveram seus direitos políticos suspensos. Outros foram tornados apátridas com a reintrodução do banimento, pena vil, havia décadas extinta pelo direito republicano. Dissidentes foram arbitrariamente presos, muitos brutalmente torturados e depois executados, como ficou devidamente registrado pela Comissão Nacional da Verdade. Acobertados pelo AI-5, agentes do Estado brasileiro cometeram crimes contra a humanidade ainda hoje impunes.
Sugerindo a edição de um novo AI-5, como resposta a eventual radicalização de manifestações contrárias ao governo, o deputado Eduardo Bolsonaro não apenas ameaça a sociedade brasileira e suas instituições democráticas, como quebra o compromisso de "defender e cumprir a Constituição", por ele solenemente assumido ao tomar posse como deputado federal, em janeiro de 2019.
Ao propor, em pleno regime democrático, a adoção de medidas de exceção, absolutamente estranhas à Constituição, reincidiu em ato de absoluto descompromisso com os direitos fundamentais, com a separação de poderes, com a Federação e o voto popular, todos valores protegidos como cláusulas pétreas, pelo artigo 60, parágrafo 4º da Constituição Federal de 1988.
A Comissão Arns, preocupada com mais essa ameaça aos direitos humanos e à democracia, espera que a Câmara dos Deputados tome todas as medidas cabíveis para impedir que as imunidades parlamentares, concebidas para habilitar o debate democrático e assegurar o pleno exercício do mandato popular, sejam empregadas de maneira abusiva, com o objetivo pérfido e covarde de violar direitos e constranger o livre funcionamento dos poderes Legislativo e Judiciário, como decorreu da edição do AI-5.
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